Um dos pontos mais importantes na implementação de um projeto de administração de passivo empresarial é a atuação jurídica contenciosa combativa assertiva, ou seja, àquela que reúne as condições necessárias a assegurar penhoras abusivas em face dos devedores.
Portanto, o manejo de peças processuais abarcadas com soluções jurídicas aplicáveis e, principalmente acatadas pelos Tribunais, é imprescindível para o sucesso da implementação desse projeto.
Hoje trataremos de recente caso de responsabilidade do nosso Departamento Empresarial, em que houve a admissão direta de Recurso Extraordinário em razão da atuação combativa que preencheu todos os requisitos necessários à forma.
Em meados de 2019, houve o deferimento da penhora do imóvel residencial de um de nossos clientes envolvidos nos projetos de administração de passivo empresarial, oriundo de processo executivo originário de execução de alugueres inadimplidos.
Tal penhora foi mantida após interposição dos recursos cabíveis no Tribunal de Justiça – 2ª Instância, sendo necessário, por conseguinte, a atuação eficiente direcionada à definição da melhor estratégia para que o caso fosse remetido e apreciado pela Instância Superior.
Sabe-se que para efetiva admissão de recursos pelas Instâncias Superiores, é imprescindível a elaboração mediante análise minuciosa da instrução processual e dos fundamentos da sentença, sem contar, por óbvio, de questões obrigatórias, como o recolhimento das custas.
É essencial verificar, inclusive, se há chances reais de reforma da decisão combatida, pois do contrário, o cliente estará sujeito à multas por recursos protelatórios, bem como arbitramento de honorários.
Assim, a atuação contenciosa estratégica se faz fundamental para que consigamos a tão esperada admissibilidade dos Tribunais.
À título de esclarecimento, o Recurso Extraordinário é um recurso objetivo, em que os fatos narrados e provas discorridas pelas partes não são rediscutidos, mas apenas as teses jurídicas e as matérias de direito constitucional que envolvem o exame do pedido inicialmente formulado.
Está previsto no artigo 102, inc. III da Carta Magna, sendo destinado ao reexame de decisões judiciais que afrontam, essencialmente, o texto da Constituição Federal.
Relembramos que o caso em questão, trata-se de imóvel de bem de família do fiador em locação comercial, motivo pelo qual, no exemplo ora elucidado, a finalidade central do recurso foi o afastamento do Tema 295 que preconiza ser constitucional a penhorabilidade de bem de família de fiador de contrato de locação (Recurso Extraordinário nº 612.360/SP).
Assim, a atuação jurídica assertiva deve pontuar, nos termos da lei, a existência de repercussão geral como requisito de admissibilidade do recurso extraordinário, circunstância que foi objeto de regulamentação pela Lei 11.418/2006.
Isto é, para que a Supremo Tribunal Federal aprecie o mérito do recurso extraordinário, deve o patrono atento ao caso demonstrar, a existência de questão relevante do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico e que a pacificação da matéria não é relevante apenas aos litigantes, mas que a questão ultrapassa os limites subjetivos da lide, e que refletirá decisivamente em número expressivo de litígios, pois os casos em que há a repercussão geral são submetidos a sistemática dos recursos repetitivos, apesar da inexistência de vinculação expressa em lei.
No caso em apreço, a questão debatida versa sobre impenhorabilidade de bem de família e de bem de família do fiador em contrato de locação comercial, vez que a penhora e medidas de expropriação ferem diretamente o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, bem como ao Direito de Moradia e Propriedade, dispostos nos artigos 1ª, inciso III, e 5º, caput da Constituição Federal.
Cabe in casu, portanto, a proteção do direito fundamental e social à moradia, que repercutirá de forma significativa e importante em termos jurídicos e sociais, eis que uma decisão favorável ao Recorrente criará importante precedente.
Ressalta-se que o tema foi objeto de julgamento pela 1ª Turma Recursal do Supremo Tribunal Federal, RE 605.709, iniciado em outubro de 2014 e finalizado em 12 de junho de 2018, tendo como relator o ministro Dias Toffoli, então ainda integrante da turma, sendo decidido, por maioria de votos (3 a 2), pela impenhorabilidade do bem de família do fiador em contrato de locação comercial.
Foi relevante mencionarmos que o Acórdão proferido nos autos do recurso que manteve a penhora do imóvel, violou o princípio isonômico, visto que o afiançado, que não pagou os alugueres, beneficia-se pela impenhorabilidade, ao passo que ao fiador, se mantida a r. decisão de origem, estaria subtraindo o benefício.
Assim, entendeu o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, responsável por analisar preliminarmente a admissibilidade de origem do recurso, estar demonstrada a repercussão geral, visto que o recurso possui relevância social, jurídica e econômica porque contribui à uniformização da jurisprudência do STF, resultando em resolução célere das demais causas paralelas (efeitos vinculantes). No aspecto social, a consolidação de entendimento sobre o entendimento de impenhorabilidade no caso em tela implica em segurança jurídica.
As razões do recurso pautaram-se na alegação de violação expressa aos dispositivos da Carta Magna, mais precisamente, aos artigos 1ª, inciso III, e 5º, caput.
Foi reforçado que a impenhorabilidade do imóvel se trata de matéria de ordem pública, de natureza constitucional, que não sofre os efeitos da preclusão, podendo ser feita a qualquer tempo e fase do processo.
Ademais, fora reprisado que em decisão datada de 15 de junho de 2018, a Primeira Turma deste Supremo Tribunal Federal decidiu que não é possível penhorar o bem de família do fiador na locação comercial, enaltecendo as decisões da R. Ministra Rosa Weber e do D. Ministro Marco Aurélio, por exemplo.
Logo, ante a malversação da Constituição Federal e evidente ofensa ao disposto nos artigos 1ª, inciso III, e 5º, caput do mesmo dispositivo, assim como a comprovação da existência da repercussão geral, o Presidente da Seção de Direito Privado admitiu o recurso extraordinário interposto para apreciação do STF.
Assim, mediante a atuação assertiva e estratégica contenciosa, foi possível respaldar ao cliente a retomada da chance de êxito, principalmente pela admissão direta do Recurso Extraordinário interposto, ainda que o Supremo Tribunal Federal vem sendo bastante cauteloso quando do julgamento do mérito da repercussão geral, especialmente em razão de inúmeros processos sobrestados, aguardando a solução da controvérsia.
Até lá, comemoram-se as estratégias em favor do cliente e a tão rara admissibilidade dos recursos contundentes às instâncias superiores.
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