INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR NA RESOLUÇÃO CONTRATUAL DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA E IMPACTOS QUANTO À RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS.
Não bastasse a complexidade mercadológica, logística e operacional enfrentada, os players do mercado imobiliário ainda têm que direcionar atenção ao vasto sistema jurídico que disciplina esta seara dos negócios, sob pena de sofrerem prejuízos financeiros de grande monta.
Para alívio do empresário, o Superior Tribunal de Justiça firmou tese vinculante mitigando a aplicação do artigo 53, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), nos contratos garantidos por alienação fiduciária. Entenda:
É sabido que a legislação pátria é protetiva ao consumidor e possui diversos mecanismos de frenagem contra abusos do fornecedor de produtos e serviços, considerado parte hiper suficiente do liame contratual.
O artigo 53 do CDC é exemplo claro da intenção estatal de regular as relações privadas, buscando equalizar a dinâmica negocial, oferecendo possibilidades de defesas para o consumidor.
A norma supracitada determina a nulidade da cláusula que preveja a perda total das prestações pagas pelo comprador na hipótese de resolução por inadimplemento de contrato garantido por alienação fiduciária.
A disposição do Código de Defesa do Consumidor conflita diretamente com o artigo 27, da Lei da Alienação Fiduciária (9.514/97), cuja previsão determina que: em caso de resolução de contrato com cláusula de alienação fiduciária por inadimplemento, o credor apenas devolverá o valor residual daquele que fora arrematado em leilão, caso a dívida e acessórios sejam integralmente pagos.
Por um lado, o consumidor possuía garantia legal, pelo Código de Defesa do Consumidor, de que necessariamente deveria receber parte de seus investimentos no imóvel, ainda que tenha inadimplido o contrato. Por outro, a Lei 9.514/97 conferia ao credor o direito de leiloar o imóvel, devolvendo ao devedor apenas o valor residual, assim considerado a quantia arrematada, deduzida a dívida e os acessórios da alienação fiduciária.
Em acertada decisão, ao julgar o Tema 1.095, em sede de recursos repetitivos (e, portanto, vinculante a todos os tribunais brasileiros), o STJ definiu tese no sentido de que os contratos com cláusula de alienação fiduciária devidamente registrados na matrícula do imóvel devem submeter-se à sistemática estampada na Lei nº 9.514/97 e não ao Código de Defesa do Consumidor.
Dessa forma, restou definido que o devedor inadimplente de contrato com cláusula de alienação fiduciária devidamente registrado na matrícula apenas receberá alguma quantia caso o valor efetivo arrecadado com a venda do imóvel em leilão cubra todas as dívidas perante a instituição financeira e ainda reste algum montante, que só então será direcionado ao fiduciante.
Em que pese ainda não tenha sido publicado o acórdão da decisão, contendo as razões para definição da tese, é possível inferir que os métodos de solução de conflitos normativos (antinomias), preconizados pela Lei 4.657/42, foram determinantes para o resultado do julgamento. Além do Código de Defesa do Consumidor ser norma mais antiga (datada de 1990), também trata o assunto de forma genérica, enquanto a Lei nº 9.514, de 1997 (e, portanto, mais recente) traz disciplina específica. É cediço que a norma especial se sobrepõe à geral, assim como a lei mais nova revoga a mais antiga, no que for incompatível.
O cuidado a ser tomado pelo credor fiduciário é registrar o compromisso de compra e venda com cláusula de alienação para garantir a aplicação do quanto estabelecido pela Lei nº 9.514/97. Caso contrário, o negócio jurídico, neste tocante, será submetido ao regime do Código de Defesa do Consumidor.
As operações imobiliárias, pela complexidade e mutabilidade decorrente da flutuante jurisprudência, devem sempre ser acompanhadas de advogado especialista.
Reprodução: Pixabay.com
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