Atualmente vivemos a chamada “Coronacrise”, com efeitos econômicos e sociais que provavelmente se estenderão pelos próximos anos. Diante desse cenário, nesse instante, o foco das empresas está em sobreviver, o que significa basicamente adaptar seus processos internos às limitações impostas pelo governo e adotar medidas de contenção de gastos.
Porém, não se pode deixar de pensar e planejar a retomada. As empresas afetadas pela crise devem estar preparadas para retomar a operação nos patamares anteriores ou até expandi-la, e para absorver de forma menos traumática os impactos da crise.
Via de regra, o passivo trabalhista é motivo de grande preocupação por parte dos empresários brasileiros, principalmente em razão da legislação historicamente protecionista, aplicada por uma Justiça Especializada mais célere e agressiva com relação às execuções.
Todavia, o momento não é para desespero! O empresário agora deve estar focado na sobrevivência, na adaptação dos processos internos, no impulsionamento do seu negócio e também no planejamento da retomada pós crise.
Assim, é importante ter em mente que o passivo trabalhista, apesar inevitável para muitas empresas, não precisa ser um trauma, tampouco inviabilizar a continuidade do negócio. Quando previsto, medido e bem administrado, o passivo trabalhista pode ser adaptado ao fluxo de caixa empresarial, possibilitando que a organização enfrente a crise de forma sustentável e esteja pronta para a retomada de crescimento.
A gestão de passivo eficiente requer um planejamento estratégico estruturado, que considere os fatores risco, tempo e custo. No plano tático, especificamente na condução de cada processo, é possível lançar mão de algumas ferramentas que permitem a adaptação da realização do passivo ao fluxo de caixa da empresa, evitando que as dívidas trabalhistas comprometam a lucratividade do negócio ou até inviabilizem sua continuidade.
Para os processos em que há cumprimento de acordo em curso, por exemplo, tendo em vista a alteração das condições fáticas, e buscando o reequilíbrio do pactuado, é possível buscar a renegociação com a parte contrária, seja para redução do valor acordado, seja o rearranjo da forma de pagamento para adaptá-la ao caixa empresarial, ou ainda para minimizar a aplicação da cláusula penal.
Em casos mais sensíveis, em que o adimplemento do acordo pode comprometer a continuidade de negócio, vislumbra-se inclusive a hipótese de suspensão do pagamento por motivo de força maior, por determinação judicial.
Outra medida que pode auxiliar o caixa empresarial nesse momento de crise, é a identificação dos processos que possuem garantia, mas ainda não transitaram em julgado. Nesses casos, através de negociação com a parte contrária, é possível pôr fim à demanda mediante liberação do valor acordado ao Reclamante, e o remanescente à empresa para livre utilização.
Outra opção, que foi autorizada recentemente pelo CNJ, é a substituição de depósito recursal ou penhora em dinheiro por apólice de seguro garantia. No processo do trabalho, o depósito recursal é requisito para interposição de recursos, e varia entre R$ 9.828,51 e R$ 19.657,02. A legislação já contemplava a hipótese de substituição do depósito por seguro garantia no momento da interposição do recurso, porém, no entendimento do TST não seria possível substituir depósitos preexistentes pela apólice.
Considerando que esses valores impactam expressivamente no fluxo de pequenas e médias empresas, e também no das grandes, que contam com um número relevante de reclamações trabalhistas, a possibilidade de substituição e consequente liberação dos valores “parados” pode ser determinante no momento de crise e caixa apertado.
Além disso, ainda com relação ao depósito recursal, microempresas e empresas de pequeno porte podem se valer de regra específica para interpor recursos. O parágrafo 9º do artigo 899 da CLT autoriza que essas empresas recolham o depósito recursal pela metade. Essa ferramenta, além de viabilizar a revisão do julgado, se presta a postergar o trânsito em julgado, retardando o início da execução.
Ainda como alternativa para recorrer, aquelas empresas que comprovadamente não possuem condições de arcar com as custas processuais, podem ser contempladas com o benefício da justiça gratuita e isenção de pagamento. Apesar de a concessão desse benefício a empresas ainda encontrar forte resistência na Justiça do Trabalho, nos últimos tempos acompanhamos o crescimento da corrente favorável, o que acreditamos ser uma tendência, especialmente no momento atual.
Por fim, no que se refere aos processos já liquidados, que se encontram em fase de execução e a empresa não possui caixa para fazer frente ao débito, nem bens para oferta em garantia, é possível lançar mão do pedido de parcelamento previsto no artigo 916 do CPC. Nessa hipótese, os atos executórios ficam suspensos e o pagamento ocorre mediante uma entrada de 30% do valor total, com o restante diluído em 6 parcelas mensais.
Em alguns casos, esse parcelamento pode ser ainda mais vantajoso do que um acordo com a parte contrária, uma vez que estes têm por praxe multa de 50% por atraso ou inadimplemento, já o parcelamento na forma do artigo 916 do CPC prevê multa de 10%.
Diante de todas as alternativas que foram expostas, é possível perceber que o passivo trabalhista não precisa ser motivo de desespero por parte do empresário. Apesar de historicamente o processo do trabalho ser mais agressivo em relação ao devedor, é possível lançar mão de alternativas de condução processual para adaptação do momento e forma de realização do débito ao fluxo de caixa empresarial.
Em alguns casos, inclusive, o processo trabalhista pode trazer até um incremento ao caixa da empresa, mediante a liberação de valores imobilizados para livre disposição da administração.
O desafio, que deve ser delegado ao parceiro especialista, é identificar as ferramentas certas aplicáveis a cada caso específico, bem como o momento apropriado de sua aplicação, buscando o melhor resultado. Dessa forma se resguarda a continuidade e até a expansão da atividade empresarial durante e após o momento de crise.
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